ANÃO

Há um conceito equivocado, muito comum entre leigos e alguns linguistas incompententes, de que não se aprende uma língua depois de adulto. Bobagem! Além de diversos estudos sérios atestando o contrário, eu sou a prova viva que refuta esta asneira. Comecei a estudar inglês aos 21 anos e aos 25 já ensinava. Não por ser um gênio, mas por me dedicar com afinco.

Estudei na Cultura Inglesa e tornei-me professor de lá em 1999, após ter feito o TTC (Teachers Training Course) com Jackie Sabback que, além de ter sido a minha primeira mestra, foi quem acreditou no meu potencial. Jamais esquecerei as palavras dela ao me comunicar que a escola tinha interesse de que eu fizesse parte do corpo docente. Disse: “Lubis, alguns se esforçam para dar aula. Você já nasceu professor. Isso é uma grande responsabilidade. Abrace essa carreira e aproveite!”

Neste 10 anos de casa, muitos professores chegaram, tantos outros foram e, no geral, conseguimos manter um bom clima de trabalho. Obviamente, há os atritos típicos de um ambiente em que 90% dos indivíduos ciclam e sofrem de TPM. Mas nada que distoe do normal.

Vez ou outra, surgia um professor chato de galocha, mas que, para a nossa sorte, não durava muito. Lembro de um idiota antitabagista de carteirinha. Odeio esta patrulha panfletária! Se tem uma coisa que me tira do sério (e há incontáveis) é gente que vive importunando a paz dos outros com sua idéias copiadas de livros de autoajuda.

Sempre fui um fumante relativamente educado, se é que isso existe. Segurava o cigarro com a mão esquerda, pois uso a direita pra cumprimentar; se fumava antes da aula, lavava bem o rosto, as mãos e ainda mascava chiclete em respeito aos alunos; jamais fumava em frente a crianças e, no trabalho, ia até o jardim para não importunar ninguém.

Um dia, ao chegar na sala dos professores, percebi que havia um recado escrito em letras garrafais numa folha A4, pendurado na porta no meu armário, dizendo: “NÃO FUME, ESTOU RESPIRANDO!” Arte de quem?

Quase enlouqueci de raiva. Como assim?! Aquele merdinha que só vestia camisa pólo por dentro da calça e não devia comer ninguém querendo me dar lição de moral. Vê se tem cabimento! Não contei dois, peguei uma folha A3 no almoxarifado, escrevi com piloto vermelho “NÃO RESPIRE, ESTOU FUMANDO!” e, com cola cascolar – aquela bem gosmenta que dá um trabalho retado para ser removida – afixei meu singelo cartaz na “mochila fashion que acabei de comprar em SP” do fedelho.

PUTAQUEPARIU, mermão! Se não quer fumar, ótimo. Mas, por favor, deixe eu me matar à vontade! Que fumar é nocivo à saúde, todo fumante está careca de saber. Os não-fumantes é que não entendem o quanto fumar é gostoso.

“Come to where the flavor is. Come to Marlboro country” é o lema do cigarro mais famoso produzido pela antiga Phillip Morris, fabricante londrina que criou, em 1902, sua primeira subsidiária em Nova Iorque para vender suas marcas, entre elas, Marlboro.

Nunca fumei compulsivamente mas fui fiel a este cigarro forte e encorpado de filtro amarelo por 16 anos. Era daqueles que fumam aproveitando o instante, quase como um ritual. Só quem fuma assim consegue dimensionar o que representa um trago no meio da noite quando a solidão bate à porta. Um cigarro bem fumado pode ser uma excelente companhia.

Mesmo mantendo uma média de quatro a cinco cigarros por dia, largar o vício foi uma tarefa árdua. Se por um lado tenho um paladar mais apurado agora, por outro, ganhei 15 quilos! Tenho ganas de voltar. Repito, diariamente, que não sou ex-fumante, mas sim um fumante que não fuma. É somente uma estratégia para evitar deslizes. Por experiência própria, sei que um tragozinho de nada é o suficiente para jogar todo meu esforço no lixo.

O fato é: fumar é bom pra caralho. Por isso, sucumbir à tentação da nicotina também não é o fim do mundo. Afinal, parar de fumar é fácil, basta apagar o cigarro. Foda mesmo é não voltar! Conheço, a propósito, várias pessoas que voltam para o tabaco depois de já, aparentemente, estarem lidando bem com a maldita abstinência.

Com uma querida amiga míope foi assim. Abandonamos o cigarro, coincidentemente, na mesma época. Poucos meses depois, entretanto, me surpreendi ao vê-la acendendo um mata-cachorro qualquer! Senti-me traído!

Há de se fazer justiça, porém. O motivo da recaída foi, indubitavelmente, o mais legítimo de todos no mundo mundial! Veja se você não concorda comigo.

– Porra, babes, não acredito! Achei que estivéssemos no mesmo barco! Puta que pariu! Como assim, você voltou a fumar? Como assim?!
(Na moral, ex-fumante só perde em chatice para ex-mulher!)
– Foi mais forte que eu e...
– Não me venha com desculpa esfarrapada do tipo “ai, mainha, meu pé ta doendo, meu pé ta doendo!”
– Queria ver se você estivesse no meu lugar, se não voltava a fumar também.
– Nêga, só queria te lembrar que minha namorada fuma. Eu passo por provações todo santo dia! Nada pode ser pior que isso!
– É mesmo? Então se ligue: eu tava trabalhando como produtora de um filme. Meu chefe andava a mil por hora à base de café e cigarro. E eu, na minha, segurando a onda. Não houve um dia sequer que tenha trabalhado por menos de 10 horas. Já tava um caco... nas últimas mesmo. Foi quando num domingo de manhã cedo, tipo umas 7 horas, após ter ido dormir às quatro da matina, meu celular tocou e adivinhe quem era? Meu amado chefinho. Ninguém merece o chefe ligando no único dia de folga! Ainda sonolenta, coloquei os óculos para escutar melhor e tive que ouvir o seguinte: “desculpe, querida, talvez seja um pouco cedo, mas mudei alguns planos da filmagem e preciso que você me consiga, para hoje antes do meio dia, um anão”.
– Como assim, um anão, amiga?! Como assim?!
– Pois é. Daí acendi um cigarro!

Este texto foi revisado por Paula Berbert

11 Response to "ANÃO"

  1. Anônimo Says:

    Que maravilha sua trajetória profissional, cara. Parabéns!!!

    [...]

    Tenho o sonho de ser fluente na língua inglesa. Pelo simples prazer de compreender e me fazer entender neste instrumento de comunicação humana. Falta-me algum afinco. Quem sabe, um dia... :-)

    [...]

    Velho, que cara chato este “professor antitabagista”!

    [...]

    Man, com certeza. E sabe o que eu digo? Porra, existem tantas verdades (leia-se certezas) no mundo... Apontar o cigarro como “o mal dos males”, não dá. Eu fumo há cerca de um ano. Nunca passei de 4 cigarros por dia. Praticamente todos os dias. Sem dúvida que é um prazer. Momentos únicos. Posso estar equivocado, afinal tenho pouca experiência de vida e de vida de fumante menos ainda, mas no meu caso, não considero um vício (ao menos, ainda). :-)

    [...]

    E esse final da história da sua amiga, foi ótimo! Hahahaha. Muito bom!

    Abração, velhão!

    Paullo Phirmo.

  2. Mima Sampaio Says:

    Nossa Lubis, ja estava sentindo falta dos seus textos. É impressionante que lendo, parece que vc esta falando na minha frente!! adorei!! A propósito, amei saber que ainda tenho chances de aprender inglês!! rsrs
    bjão
    Mima

  3. Clarice Says:

    Oi Lubisco, querido! Vc não me conhece, mas alguns amigos seus sim, haha! Seguinte: gostei do seu texto e concordo com a perseguição chata dos anti-tudo. O caminho anti só pode trazer antipatia mesmo, não integra, não congrega nem gera empatia. Por outro lado, não precisa justificar o apreço pelo objeto do seu vício deixado, ele é suficientemente nocivo para não ser redimido pelos prazeres colaterais que provoca, haha :-) Como elucida um psicanalista amigo, todo viciado em algo tem por esporte justificar o seu vício para, de alguma forma, glorificá-lo e, assim, ser aceito.

    Controvérsias à parte, na moral: fumantes em ambientes fechados são o fim da picada, para quem não fuma, e pra quem fuma também! Eu conheço uma pessoa que fuma, mas detesta cigarro alheio, cê acredita? Não se trata de implicância, mas a fumaça é uma invasão de espaço vital, pois vc é obrigado a respirá-la por falta de ar circulando.

    Eu moro em Buenos Aires e desde a tragédia do Cromañon (uma casa de shows que pegou fogo há 5 anos, onde morreram 194 pessoas) que em lugares fechados é proibido fumar por aqui. Outro dia, de férias, fui a um bar de SSA onde as paredes são cobertas com palha. Te juro que, depois do que vi aqui, imaginei algo parecido! Basta tomar uns copinhos a mais e apenas triscar o cigarro na palha para ver o fogo arder. Se as paredes eram de palha, vc imagine a saída de emergência...inexistente!

    Salvador ainda é uma cidade com poucos fumantes, se comparada com outras metrópoles da América Latina, como Baires. Eu tenho uma teoria para isso, depois de quase seis anos aqui, mas prefiro não arriscar nessas linhas.

    Parabéns pela resistência. Diga à sua amiga que um anão não merece tanto!

    Besos y mucha suerte!

  4. mov. nac. de busca e apoi a pessoas desaparecidas Says:

    a aptidão é do fisiologismo individual, mesmo. isso explica pq uns conseguem e outros não a aprender língua já adultos. não foi chomsky que disse isso, mas...

    parabéns por largar o cigarro, está fora de moda, mesmo.

    e é como o aprendizado da língua, quando adultos. não há como depender só do afinco.

    beijo!

  5. Mariana B. Says:

    lubiiiiiis!! kkkkkkk... coitada..! um anão! já passei por isso... ela mereceu fumar um cigarrinho.. era marlboro? adoooooro!

    ps: se ela precisar de novo, eu ainda tenho os contatos dos anões.. rsrs!

  6. silvana Says:

    Parabéns Lubisco! Quando comecei a ler fiquei em suspense, pensando que você tinha voltado a fumar, ainda bem que não. Se você conseguiu em 4 anos de estudo tornar-se "O cara" como professor de Inglês, tenho certeza de que manter sua decisão de não fumar é fichinha.
    Em tempo: Não posso me esquivar de dizer pela milionésima vez: Você é a minha inspiração como professor de Inglês e cada vez que sei um pouco mais de sua história nessa área reacendo as minha esperanças de alcançar pelo menos um nível aceitável.
    Bjs e saudades...

  7. Alexandre Beanes Says:

    17 dias sem cigarros...espero que ninguém me peça um anão no trabalho, pois a vontade de fumar bate diariamente!

  8. Cris O Says:

    Todo mundo anda querendo parar de fumar...se essa moda pega vao querer desistir de cerveja, sexo, outras drogas e rock'n roll tbm.

    P.S. Sua amiga achou o anao?

    Beijos

  9. Anônimo Says:

    Hey!
    "Há um conceito equivocado, muito comum entre leigos e alguns linguistas incompententes, de que não se aprende uma língua depois de adulto."
    Nesse caso a vodka funciona! :)

    "O fato é: fumar é bom pra caralho."
    Nesse caso eu prefiro não comentar...

    Beijo teacher :*

  10. Jessy Says:

    7 horas da matina e ter q ir atrás de um anão! espero q ela tenha encontrado...
    Enfim, com certeza qlqr pessoa pode aprender uma língua estrangeira se houver dedicação.. força de vontade.
    e q bom q n voltou a fumar...
    Beijos, Lubis! Miss you, teacher!

  11. Cris O Says:

    Rapaz... como é que vc deixa um comentário no meu blog me queimando dessa forma? Vou negar essa estória de Kolene e bob até o fim, portanto nao insista!!!! hehehehe.

    No entanto, aceito os elogios numa boa hehehehe.

    P.S. pra vc que já viu tantas variacoes do cabelo, ele agor está mais rebelde do que nunca...